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O Não Ser Relativo das Eleições


     Nosso debate eleitoral não existe. Qualquer argumento mais ou menos razoável tem o alcance de um megafone no vácuo. Muito por causa da ineficiência do nosso sistema político de neutralizar figuras excêntricas do MDB ou PMDB que figuram por aí desde os tempos da ditadura. O PT teve a oportunidade de ouro de fazê-lo e, com certeza, esse é o seu maior defeito, todos os outros derivam desse. Jair Bolsonaro, aquele que tem medo de enfrentar as contradições do PT e de Fernando Haddad em um debate, não devemos esperar que enfrente os benefícios que a máquina do “sim, senhor” pode oferecer.
     Aliás, o quê devemos esperar de Bolsonaro, o quê ele disse ou o quê não disse? O quê ele fez a vida inteira, ou o quê deixou de fazer? Essa pergunta é difícil de responder. Porque não se sabe, exatamente, sobre o quê ele pensa, o quê ele disse ou diz, e nem o quê faz ou fez. Isso me faz lembrar lá dos gregos, Parmênides um dos primeiros, se não o primeiro, pensador metafísico. Ele dizia “O Ser É, o Não Ser Não É”, muito obvio, tudo o quê É, É. O que não É não pode nem ser pensado. Mas como o mundo não cabe em obviedades, algum tempo depois no livro O Sofista, Platão cometeu, o que ele próprio chamou de Parricídio, quando sepultou a ideia de Parmênides criando o “Não Ser Relativo”.
     Platão diz que algo pode Não Ser como de fato É. Por exemplo: uma porta verde pode parecer uma porta azul de acordo com o reflexo. Todavia, eu chamá-la de porta azul, mesmo sendo verde, não altera sua existência, mesmo ela sendo verde. Por isso, se trata de um não Ser Relativo. Esse é de fato Jair Bolsonaro, de tudo que ele falou e fez na sua vida ser desdito ou colocado em suspenso nessa eleição, não deixou de SER, mas de fato não o É. Isso criou uma lacuna que pode ser preenchida por qualquer coisa, e foi preenchida com os anjos e demônios de seus eleitores cada um ao gosto do freguês.
     Esse conjunto de eventos é como aquela atividade das séries inicias na escola, onde a professora repassa um desenho de um personagem não muito conhecido só em traços, e ordena que seus alunos pintem de acordo com sua preferência. Cada um pinta de acordo com o seu gosto, assim o desenho passa a existir naquelas cores. Cada desenho tem o colorir do seu “artista”, mas no fundo o personagem não tem ligação com nenhuma dessas “obras”. E o apego a isso se constitui por ser exatamente uma identificação que o “artista” tem com o personagem.
     O personagem é o que pintamos dele, é uma parte do seu artista. Dispensar uma parte nossa é difícil e dolorido. Muito parecido com a Identificação Projetiva, claro com as devidas ressalvas, um mecanismo de defesa do nosso inconsciente descrito por Melaine Klein. Isso resume como cada um se projeta no lugar de Bolsonaro e tenta ver o mundo a partir daí. Teoricamente, não podemos pensar desse ponto de vista, entretanto, em um mundo onde os demônios estão soltos precisamos de padres e pastores que cuidem da paróquia e não que celebrem grandes cultos.